terça-feira, 7 de agosto de 2012

Zeca Camargo comenta sobre novo álbum de Justin Bieber, Believe



O repórter brasileiro Zeca Camargo publicou nesta segunda-feira em seu blog uma matéria onde comenta sobre o single de Justin Bieber, Baby, o qual levou o canadense à ascensão mundial. Além disso, ele também citou sobre seu novo álbum, Believe. Vale a pena conferir:
“Baby” é uma canção quase perfeita. Funciona como uma espécie de resumo da angústia romântica de um adolescente de 16 anos – a idade que seu autor tinha quando foi escrita. Se quem estiver ouvindo a música tiver também 16 anos – some ou tire uns dois ou três anos –, a química é perfeita. A letra traduz uma súplica sutil de alguém que está muito apaixonado, mas ainda não tem certeza de que vai conseguir o que quer. O que faz então esse pobre coração solitário? Pede e pede e pede – pede sem para que seu amor fique com ele. Uma certa dose de melodrama é fundamental, e combina perfeitamente com a balada irresistível da música. Você até pode dançar, se estiver a fim, mas a faixa foi feita principalmente para ser ouvida – e, depois, para conquistar. Seria uma canção triste, se a gente não adivinhasse que seu poder de sedução é certeiro e infinito.
Porém, mesmo com tudo isso a seu favor, “Baby” não foi um grande sucesso. E se você acha que eu estou ficando louco, é porque está confundindo as coisas. Não estou falando do “hit” que colocou Justin Bieber no mapa – não só da Terra, como do Universo! (Mais sobre Bieber e seu novo álbum mais adiante). Essa “Baby” que não deu certo foi gravada em 1979, por uma dupla de irmãos que a história do pop esqueceu – ou melhor, uma dupla que a história do pop poderia até ter se lembrado, se alguém fora da cidade de Fruitland, no estado de Washington (EUA), soubesse da existência de um disco chamado “Dreamin’ wild”.

Falo de Donnie e Joe Emerson, dois irmãos “prodígio” que, sem nenhuma noção de como funcionava o mercado fonográfico, e apenas uma leve ideia do que acontecia no mundo da música pop na segunda metade da década de 70 – ajudados por um pai que acreditava no talento dos filhos como se fosse um presente divino – conseguiram gravar um disco sensacional, que deveria ser considerado um clássico da música “outsider”, ou “fora do circuito”. Com um atraso de meros 30 anos, é possível até que isso aconteça, uma vez que “Dreamin’ wild”, o único trabalho que a dupla gravou na época, foi finalmente redescoberto, e lançado em CD por um obscuro (ainda que divertidíssimo) selo independente chamado Light in the Attic. Não quero dar de esperto aqui: eu mesmo nunca havia ouvido falar desses caras (e olha que eu fuço…), mas na semana passada, quando estava em Nova York e dei aquela passada estratégica naquela que é, para mim, a melhor loja de discos do mundo (Other Music), deparei-me com essa capa – e fiquei hipnotizado.

O que haveria por trás dessa estranha imagem (que, como li depois no livreto que acompanha o CD, sugere vagamente que se trata de uma dupla de xifópagos)? Por que alguém lançaria um álbum assim em pleno 2012? Seria algo mais interessante do que uma mera curiosidade? E – mais importante de tudo: de que se tratava a faixa 3, com o curioso nome de… “Baby”? Quando finalmente cheguei em casa e escutei “Dreamin’ wild” por inteiro, tive bem mais do que as respostas para as perguntas acima… Tive uma revelação!
Assim que os roucos acordes de “Good time” (a primeira faixa do álbum) chegaram aos meus ouvidos, a pergunta-clichê veio sem convite: “como eu nunca tinha ouvido isso antes”? E ela veio com um misto de culpa e contentamento: sim, eu estava diante de uma preciosidade e estava prestes a mergulhar fundo nela. Aqui, porém, vale um aviso de advertência: sou tão desconfiado quanto você do fascínio que certas “esquisitices” exercem em círculos “cult”. Não cedo facilmente a músicas e artistas “estranhos” simplesmente porque eles são, hum, “estranhos” – ou porque são extremamente difíceis de encontrar, ou porque foram sub admirados por anos. Um bom exemplo disso é The Shaggs – aquelas irmãs ligeiramente “sem noção” que gravaram um dos discos mais bizarros de toda a história do pop, em 1969, encravadas em Fremont (New Hampshire, EUA), e que ficaram famosas, entre outras coisas, por receberem um elogio inesperado de Frank Zappa (ele teria dito que elas eram melhores que os Beatles). Mais de uma vez insisti com “Philosophy of the world” – o único disco que elas gravaram – e, apesar de ter achado graça em algumas faixas (isto é, apesar de algumas faixas terem me proporcionado boas risadas – “My pal foot foot” é simplesmente inacreditável!), acho sinceramente impossível dizer que aquela música é boa…
Já com Donnie & Joe a história é outra. Os meninos eram bons! Fora “Baby” – que já está em alta rotação no meu iPod (e você pode ouvir na seção do “Refrão” de hoje) –, “Dreamin’ wild” tem outros momentos brilhantes. Como a já citada faixa de abertura; ou a surpreendentemente funk “Feels like the sun” (como alguém ainda não “sampleou” isso?); ou a psicodélica “Give me that chance” (considerando que os garotos não usavam drogas na época, não dá para entender como eles vieram com uma faixa como essa!); ou a belíssima (e bem atual) balada “Dream full of dreams”; ou a inesperadamente densa canção final, “My heart”. Vai por mim, o disco em bom!
Mas, como a enorme lista de artistas injustiçados do pop sempre nos lembra, Donnie & Jon não estavam fadados ao estrelato. E não foi falta de investimento. Como descobri depois, o pai deles, um fazendeiro do interior, construiu um sofisticado estúdio de gravação – com um custo de 100 mil dólares (uma pequena fortuna ainda hoje, uma quantia impensável na época). O que aconteceu com a dupla é que eles ficaram totalmente de fora de qualquer circuito comercial – ou mesmo de uma programação decente de rádio. O estado americano de Washington tem Seattle como sua capital – o berço da revolução “grunge”, como qualquer fã do Nirvana sabe bem (fico imaginando qual seria a reação de Kurt Cobain, que um dia me apresentou um CD dos Mutantes e me perguntou onde ele poderia arrumar mais “daquilo”, ao ouvir “Dreamin’ wild” se o tivesse encontrado em algum sebo da cidade – mas eu, obviamente, divago…). A distribuição do álbum de Donnie & Joe, porém, mal ultrapassou as fronteiras de Fruitlan – quando muito chegou a Spokane, a “cidade grande” da região. E sua existência mal teria sobrevivido não fosse uma série de acasos que o material do CD conta de maneira saborosa.
A “Baby” de Donnie & Joe merecia mesmo ser um grande sucesso – mas o destino não quis assim. Uma canção com este nome – estava escrito – estava predestinada para estourar na voz de um outro garoto de 16 anos, mais de trinta anos depois. Agora sim, falo de Justin Bieber – o astro mundial, que entrevistei recentemente, e que acaba de lançar seu novo trabalho, “Believe”. Muita gente já falou do disco, e ele já é um sucesso de vendas internacional, independente do que as pessoas escreveram sobre o CD – bem ou mal. Porém, inspirado por “Dreamin’ wild”, eu resolvi fazer uma experiência inusitada: seria possível eu ouvir Justin Bieber hoje com o mesmo frescor com que escutei o álbum de Donnie & Joe? Se eu não tivesse nenhuma informação sobre o “pop star” e encontrasse “Believe” num “sebo do futuro”, qual seria a minha reação?
De cara, confesso que não foi tarefa fácil. Afinal, a gente parece que vive num “universo Bieber”! Suas músicas estão por toda a parte – seu rosto está em todo canto. E ainda por cima, como jornalista de cultura, eu sou constantemente informado do que acontece na carreira dele – e até me aprofundei especialmente no assunto para a última entrevista. No entanto, mesmo com todos esses obstáculos, hoje de manhã eu coloquei “Believer” para experimentá-lo de ouvidos limpos. E sabe qual meu veredicto? Ali existe um álbum excelente – mas que não poucas vezes é prejudicado pelo excesso de produção.
Prefiro começar pelo “maior motivo de orgulho”: “Die in your arms”. Essa é sem dúvida nenhuma a melhor música que ele jamais gravou – uma pequena obra-prima do pop, diretamente inspirada pelo som da Motown (Jackson 5 teria feito um estrago com essa canção!), atualizada para o século 21, e que cai como uma luva para a voz semi-inofensiva de Bieber, e certamente vai encantar qualquer fã que ainda não está convencido (ou convencida) do seu potencial. Eu já tinha decorado a música depois de apenas uma audição – é boa, é “catchy” (como os americanos descrevem uma canção que “gruda” na mesma hora no seu ouvido), é romântica, é adorável, e é, sobretudo, simples. E foi exatamente por isso que quis começar a falar de “Believe” por ela. Se os produtores do álbum tivessem tido o bom senso de seguir essa regra da simplicidade, o trabalho todo teria sido muito melhor. O acúmulo de efeitos, camadas sonoras, convidados especiais (como já escrevi neste espaço, venero Nicki Minaj, mas você acha realmente fez diferença em “Beauty and a beat”?), vontade de agradar todo mundo ao mesmo tempo – todas essas coisas juntas acabam confundindo um ouvinte que quer apenas conferir a capacidade de Bieber de interpretar uma boa canção.
Os excessos são mais gritantes em faixas “dance”. Como é isso que está dominando o gosto americano agora (e as paradas também), dá até para entender a preocupação em favorecer esse tipo de som. Mas quando isso interfere com uma boa composição, as coisas ficam um pouco confusas. “All around the world”, que abre o disco, é a primeira evidência disso – coisas demais que acabam dizendo pouco, e deixam a voz de Bieber quase anônima. Felizmente, “Boyfriend” chega em seguida para limpar essa impressão. Produzida na medida certa, ela combina uma letra justa, um violão meio flamenco, o próprio cantor, uma batida despojada, e um distante “assovio”, para criar (essa sim) uma bela introdução para um Bieber que – como ele me contou na recente entrevista – já não é mais um garoto, mas ainda não sabe se já é um homem.
O respiro seguinte – depois da confusa “As long as you love me” – vem com “Catching feelings”. Bela canção, belo violão (de novo), e um certo toque de (ele mesmo) Michael Jackson ajudam você a se lembrar que ali tem um bom intérprete. “Take you” vem a seguir, como uma faixa rejeitada do último álbum de Madonna: seu refrão é bom demais, mas acaba se perdendo em uma (outra) confusa produção. A parceria com Drake, em “Right here”, passa sem dor – e sem deixar lembrança. “Fall” tem um coro poderoso – e certamente vai funcionar muito bem no palco (já posso imaginar todas aquelas telas de celular acesas na arquibancada). Mas aí vem “Die in your arms” – e eu tive que fazer uma pausa. Afinal eu estava diante do pop mais perfeito desde, hum, “You can’t hurry love”! Foi nesse momento que me curvei a Justin Bieber, em respeito a suas capacidades interpretativas. Estava tão feliz em ouvir “Die” duas, três, seis, dez vezes, que mal se sentia animado a avançar.
Foi desconfiado que passei para “Thought of you” – e me surpreendi com um ótimo refrão (digamos que o segundo melhor do disco) e a única batida que realmente me levaria a uma pista de dança. Minaj chega na faixa seguinte, mas sem surpresas. Depois vem “One love” (que em hipótese alguma deve ser confundida com a do U2); “Be alright” (apenas mais uma balada); a faixa-título (onde a inspiração Michael Jackson foi usada novamente, com resultados não tão bons); e mais um punhado de “fillers” (como a indústria fonográfica chama faixas que estão lá apenas para “preencher espaço”); até tudo terminar em “Maria” – uma espécie de “Billie Jean” (sim, “ele” de novo), que é até boa, mas também acabou vítima de uma super produção.
No final, achei que sons demais atrapalharam um disco que poderia dar a Bieber não só as multidões de fãs – que ele, aliás, já tem – mas também o respeito de uma crítica que torce para que ele seja um novo Justin Timberlake. Nesse caso específico, “mais” foi realmente “menos”. E eu arriscaria até dizer que “Believe”, para tentar deixar a impressão de um trabalho maior, poderia ter terminado ali mesmo, na sua faixa oito – justamente “Die in your arms”.
Adivinha quantas faixas compõem “Dreamin’ wild”…
O refrão nosso de cada dia
“Baby”, Donnie & Joe Emerson – apenas para convencer você de que minha “descoberta” é realmente boa. E que, se todas as condições tivessem sido realmente favoráveis, Donnie & Joe poderiam, por um breve momento no final dos anos 70, ter dominado o mundo…

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